A naturalização do mundo, da lei, do sexo e da política.
É preciso ser direto. A pobreza não é natural. Ela é o produto da política. Nos últimos dois anos constatamos que a racionalidade pretensa do homem é ditada por efeito de fatores psicológicos, se preferirem dos afetos (se preferirem ainda, da economia). Comprovamos que a realidade não é algo separável do enlace do imaginário com o simbólico, tampouco da representação que o discurso faz dela, posto que a cria, “não há fatos, mas a interpretação deles”. Vimos que a identificação a um suposto líder, na verdade a um simples traço dele, é capaz de fazer convergir a massa, e isto tudo depois de inúmeros exemplos históricos. Chegamos a provar, por meio de documentos assinados, confissões gravadas, atos criminosos que foram relativizados pelo fim que atingiriam. Vimos que o ódio, a intolerância e a insatisfação podem ser canalizados facilmente, demonizando figuras ou instituições. Imediatamente depois surgiriam substitutos que, por oportunismo, tinham à mão carta branca para operar conforme desejassem, cientes de que a massa estava em luta, com outro inimigo. Chegamos a um radicalismo de opinião, no qual, um jornalista defender em rede nacional: pobres não deveriam ter direito a carro ou casa própria, soou aceitável, e ao invés de gerar revolta, pelo contrário, gerou adeptos, muitos deles pobres, inclusive. Presenciamos homenagens a torturadores e a consequente defesa, atabalhoada, sem dúvida, mas de uma paixão cega, a ambos, torturador e homenageante. Acompanhamos músicos que lutaram contra a ditadura, e até entraram na justiça alegando prejuízo, àquela época, criticando protestos indígenas em Brasília, sob o infantil argumento de que aquilo não era índio. Essa negação se ampliou a praticamente todas as esferas, facilitando e reduzindo, simplificando o pensamento e a capacidade de crítica, sintetizando o pseudo argumento a todos os segmentos que descolassem um centímetro da correção que supõem representar. Assim, o professor foi tornado não professor, o aluno não aluno, o artista não artista, o político não político, dando margem ao surgimento de não políticos políticos, não professores professores. Atores de filmes pornô gay (nada contra, no entanto) passaram à vanguarda da moral, sendo acompanhados de evangélicos, pastores, ministros da educação. A prevenção da violência à mulher e às diferenças sexuais tornou-se pedofilia e incentivo à perversão, numa jogada que não pode se negar esperta, porque se apropria do medo dos pais, porém profundamente desonesta. Mulheres foram impedidas de amamentar seus filhos, sendo criadas salas de amamentação, cabines que se assemelham às antigas cabines de masturbação. Atos de abuso sexual públicos, contrariamente ao nu artístico, foram absolvidos por um setor do judiciário que já não esconde sua bandeira. O corpo (do homem) voltou a ser objeto de censura, meio de exercer poder. Vimos silenciosos ascender a ele, sob a justificativa de uma antipatia simples, explorada pela mídia, uma verdadeira organização criminosa. A situação só piorou, mas o jornal, bem, ele também não é parcial. Não é que não haja racionalidade nessas cabeças, é cristalino, há planejamento. Agora, planejar tudo assim às mostras e não gerar senão uma revolta tímida, de nós malogrados, é espantoso. A nós, por sermos egoístas a ponto de querer ajudar (não nos detemos ingenuamente nisso), também nos reservou, na posição que escolhemos defender, sua parcela de ódio e indiferença, primeira e última modalidades do amor. Se teremos do que nos orgulhar futuramente deste documento histórico, não será de ter convencido duas ou três pessoas a retirarem dos olhos o véu, mas por ter sido, do começo ao fim, coerentes e éticos com a insustentável posição de psicanalista.
Psicólogo clínico, especialista em Teoria Psicanalítica e em Neuropsicologia. Atende em Caçador e União da Vitória. giuliano.metelski@gmail.com – WhatsApp: (49) 99825-4100 / (42) 99967-1557.
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