Anos dourados e rebeldes
Em uma tarde de verão de 1971 estávamos todos reunidos na rua Barão do Cerro Azul, nas imediações da esquina com a Coronel Gualberto, quando, na casa situada, exatamente, na esquina destas ruas chega um caminhão de mudanças e um automóvel. Do veículo de passeio desce um casal e quatro jovens. Ali começa uma longa, embora curta, história de amizade entre este cronista e a família Murara.
Fizemos amizade logo nos primeiros dias e fiquei sabendo que eles eram naturais de Canoinhas, mas estavam morando em Curitibanos, de onde vinham.
Os garotos eram 3, Ademar, que para nós da turma da Barão seria e é até hoje o Zinho, que é de minha idade (um dia mais velho que eu), Paulo, um ano mais novo e Marcos, três anos mais novo. Havia ainda Soraia, a irmã caçula.
O patriarca da família, Ademar Murara, que infelizmente faleceu em Canoinhas, em novembro de 2010, vinha para União da Vitória para gerenciar a Indústria M Lepper.
Menciono no início desta crônica que vivemos uma longa amizade, embora curta, porque eles apenas permaneceram em União da Vitória por 4 anos, de 1971 a 1975, mas somos amigos até hoje, tanto que vamos nos reunir agora em julho, com outros amigos daqueles anos que foram um misto de dourados, com rebeldes e dos quais começávamos a ser o que somos hoje. Naquele distante ano tinha início nosso rito de passagem da infância para a pré adolescência e daí, muito rápido, para esta.
O mundo mudava depressa, os anos 60 derrubaram tabus, com o movimento de libertação feminina, com os hippies pregando um mundo de paz e amor e com a juventude se insurgindo no mundo inteiro a partir da Paris de 1968, na qual as palavras de ordem eram: é proibido proibir. Vivíamos aqui no Brasil em plena ditadura militar e no início da era do consumo, do embora clichê, é mais importante ter do que ser. Tínhamos longas e intermináveis conversas, principalmente Nivaldo Camargo, Paulo Murara e eu, primeiro não querendo mudar o mundo, mas mudar para outro mundo, inspirados no filme Easy Rider, no qual os dois jovens protagonistas deixam seus empregos, suas pacatas vidas burguesas e caem na estrada. Ainda não tínhamos emprego, tampouco motos, mas sonhávamos com o on the Road, tanto que em uma das primeiras cenas do filme, o personagem vivido por Peter Fonda, logo ao sair da cidade, tira seu relógio e o joga fora, quebrando ali a convenção com o tempo.
Dali em diante deixei de usar relógio.
Passamos das bolas, de gude, de meia e de futebol, para uma fase de questionamentos, de reflexões sobre nós mesmos, sobre nosso lugar no mundo em que vivíamos, até surgirem as primeiras namoradas, as primeiras desilusões amorosas, mas se já nem sempre podíamos estar juntos durante o dia, estávamos todas as noites, embalados por uma trilha sonora que incluía, The Who, Focus, Genesis, Yes e, principalmente, Pink Floyd.
‘Em 1975 os Murara foram embora para Canoinhas, foram e nos deixaram um pouco sem rumo.
Talvez esteja aí nossa primeira e real sensação de perda, de um certo vazio.
Ainda sonho com a casa vazia na esquina de minha rua e acordo sobressaltado, com saudade daqueles que talvez tenham sido os mais emblemáticos anos de minha vida, na qual os Murara foram importantes personagens.
De qualquer forma, uma crônica é muito pouco pra resumir quatro anos, então, volto a eles num dia destes.
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