AO MENOS TRÊS
O número serve à ciência como elo entre a apreensão da realidade, tal qual se apresenta não, mas pela suposição de que através da linguagem matemática, seja amboceptor do homem à natureza. Newton mesmo cria nessa linguagem universal, cuja tradução seria a própria descoberta de suas leis. Há números que ganham significado privilegiado nas mais diversas culturas: o um, por exemplo, representando a unidade, a união com a natureza ou com Deus. O três, tão presente no cristianismo, entre outros. Mas o número três talvez exerça uma função na nossa maneira de pensar: desde que se adotou o pensamento silogístico qualquer operação que esteja aquém dele merece desconfiança.
Podemos vê-lo na clássica dialética, nas disputas verbais, na família tradicional, no terço de férias, mineral vegetal animal, esqueleto músculo e órgãos, três poderes, pai filho e espírito, mãe filho e falo, baixo bateria e guitarra, letra palavra e frase, sim não e talvez, hetero homo e terceiro gênero, pedra tesoura e papel, sopro corda e percussão, cabeça tronco e membros, aéreo naval e térreo, país estado e cidade, oxítona paroxítona e proparoxítona, 3 x 1 = 3, monografia em três capítulos, trabalhar estudar ficar rico (…) três porquinhos. É que a oposição por si só, obriga uma síntese, é como se fôssemos forçados a completá-la. De modo que, um significante deve representar um sujeito para outro significante. Talvez não seja mais possível pensar sem o ‘ao menos três’. Pensar como se pensa.
Mesmo numa oposição de termos elide-se o terceiro, seja ele anterior, ainda que suposto, ou resultante dela. Há nisso também uma função mítica, relativa à origem e ao fim, cujo interesse se mostra na própria articulação. Ou seja, um objeto. Embora a física encontre seu objeto a todo instante ele não é exaustivo. Portanto, parece haver uma causa, feita do próprio efeito em particular. Pois, não se apreende uma causa quando ela nada mais é do que efeito de sua descoberta?
1 + 1 = 2. E se fosse 1 – 1? 0. Mítico, abstrato, invenção lógica, coisa.
O três geralmente está íntimo ao um. Há nele uma vontade de remontá-lo à origem, como se a tripartição fosse uma dívida, um eterno retorno, cada três se forma por três um, um seria o produto final de uma equação de dois elementos, uma conclusão, um fechamento. Havia gestaltistas que supunham fechar as coisas. Pensavam que podiam trancar um pensamento nele mesmo. Vontade de um. Mas então ele seria idêntico a si mesmo, não haveria uma função reflexo do pensamento, não se poderia tomar consciência, ele seria apenas um impulso. Nada mais contrário à ideologia da consciência do que não ter absolutamente consciência de nada. Ninguém sabe o que é consciência não obstante, ela não passa de um atraso mental. É como um tropeço em três tempos: tropeço, caio, entendo. Então como eu não sou eu – imagem à perfeita semelhança estática de mim mesmo – eu tenho que ser outro.
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