Bonjour Tristesse
Ano XI – Julho/1964 – Número 128
Ele sempre é Pai. Tirando-nos o prazer da convivência daqueles olhos mansos e repousados, donos do presente, outros olhos também diferentes das demais. Olhos abismais e tristes. Olhos que ficaram em mim como se eu os fotografasse: cor, forma, expressão. Olhos que contam o que lhe vai no coração. A pessoa dona de tais olhos, nunca poderá esconder que se passa em sua alma – seus olhos, como dois cristais finos, mostram o que sente o coração. O coração teima em querer esconder a ternura, a bondade, o amor em abundância que seu ser possui, mas suas virtudes são derramadas e reveladas por seus olhos.
Existem os olhos que ordenam, os que suplicam, os que contêm vulcões. Outros música e calma, luminosos ou sombrios. Os olhos dos quais me ocupo agora, possuem um misto de ternura, amor, tristeza, poesia, ausência. Olhos tristes, como os admiro. Ele tem o encanto irresistível de chamado e promessas dos mundos desconhecidos. Estão sempre calmos, carinhosos e acolhedores, mornos e atraentes. Olhos cheios de uma tristeza desconhecida, que vivem concentrados em si mesmo no esforço de nada revelar e que, paradoxalmente, tudo revelam. Encontramos (eu e meus familiares) – esse par de olhos, numa tarde triste de março… E até hoje o carregamos, mesmo longe – como agora – quando escrevo estas linhas (11-7-64), ao lembrá-los, parece que os vejo em toda a sua grandeza robusta. Há dias, em que esses olhos tomam um tom úmido de fim de tarde e se tornam mais puros, tão puros – Deus!
Como se não vivessem num mundo tão mau, como se nós não estivéssemos peregrinando por este vasto mundo sem paz. Bem sabemos que as injustiças, o fracasso de todos os sonhos melhores da humanidade, a inquietação eterna da hora presente, toda essa mistura, que é a vida, atinge profundamente a alma de cada um de nós. Poucos são os que, apesar de tudo conseguem conservar, nesta vida tão cheia de maldade, olhos assim, um manancial de lealdade, amizade boa, presença esperada, bondade, tranqüilidade e dedicação.
Como os primeiros olhos, nesta coluna, focalizados, estes, são uma benção, uma graça do céu. Seguirei pela vida, carregando comigo, a presença desses olhos – um par de olhos castanhos. Compreendo que a vida pode acumular injustiças, dor, porém nunca poderá destruir a bondade, o amor se estes vivem realmente num coração. Olhos tristes, juntamente com aqueles outros, olhos mansos e repousados que partiam, e os de meus pais, seguram e aquecem minha alma na hora que passa.
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