Breve comentário sobre o valor de exposição nas Profanações de Agamben.
Agamben em seu Elogio da Profanação, em Profanações (2007) utiliza a partir do conceito de valor de exposição de Benjamin a pornografia como um exemplo. Ele compara este valor de exposição a algo que está entre os valores de troca e uso. O valor de uso está ligado à profanação na medida em que concerne ao uso de algo que seria divino, separado do homem, ou seja, sagrado. O valor de exposição também se distingue do valor de troca por não fazer referência a nenhuma força de trabalho, não é cambiável por esta perspectiva. Ele estende essa idéia ao rosto humano, incapaz de se despir por estar sempre nu. Utiliza a inexpressividade do rosto da mulher quando é olhada, quando se vê vista, como exemplo desse esvaziamento da própria expressão. Trata-se da mulher, em especial das manequins e pornostars, que aprenderam a conquistar esta modalidade em que não se faz mais do que dar a ver, nada mais que o dar ver.
Ele cita um exemplo de uma artista cuja expressão é nula diante das cenas em que costumeiramente se espera dela o máximo prazer. A evidência é realçada por ela dirigir o olhar para a câmera. Essa absoluta indiferença dirigida ao parceiro é compartilhada pelo espectador. Ele conclui então que o dispositivo que a pornografia tenta neutralizar é o potencial profanatório. Ela (a profanação) abriria a possibilidade de um novo uso da sexualidade, o coletivo (nesse exemplo), ao mesmo tempo em que (a pornografia) o impede, pela inexpressividade da atriz. Para ele é o dispositivo desviado de seu uso possível que torna a pornografia, por exemplo, algo improfanável. E improfanável seria baseado “no aprisionamento e na distração de uma intenção autenticamente profanatória.” E completa: “A profanação do improfanável é a tarefa política da geração que vem.” (p.79)
Profanar aqui não poderia ser restituir o valor de uso, contrário a tornar-se isento à captura, aqui do desejo por um desvio, um artifício que na realidade faz desejar ainda mais, porque está ligado a uma aparente ausência, cujo impasse leva a essa captura. Profanar seria recolocar um novo uso na sexualidade, por exemplo, de forma coletiva, sem que houvesse a sacralização disso, isto é, que ela não fosse reservada, como dá a entender, aos deuses, ao capitalista, ao dinheiro. Esta sexualidade que é sagrada. Não se pode profaná-la pela dinâmica de seus artifícios, eles sempre poderão mudar, mas apenas por um uso que não esteja vinculado ao fetiche. Reich era radical nesse ponto, errou. Parece-me uma tentativa de fazer haver relação sexual, Outra relação sexual, cujo objeto existisse. Tarefa impossível, portanto. Por quê? Porque esse homem (Agamben, mas lembre-se, o conceito é de Benjamin) teve um vislumbre do real, o valor de exposição é o que encontrei de mais próximo do objeto, desvinculado da fantasia, quebrando-a e restituindo a ele seu caráter de estranhamento. Portanto não como véu, mas destituído da fantasia que o reveste. Não é preciso mencionar o sinal de angústia diante disso. Profanar o improfanável nesse caso faz todo sentido. Se deseja-se profanar, pela via do valor de uso, seja que uso for, necessariamente se recai no fetiche, na captura imaginária da fantasia. Se por outro lado se têm o vislumbre do improfanável o objeto só pode surgir não mais como objeto de desejo, mas como sinal de angústia. Profanar o improfanável me soa tão analítico quanto impossível, eis toda sua possibilidade.
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