Celebremos o passado. Sem esquecer, contudo, do futuro.
Dentro de alguns dias será rememorada a data de fundação de União da Vitória. Mais do que apenas mais uma data festiva (dentre tantas outras presentes em nosso calendário cívico e religioso), trata-se de uma oportunidade valiosa para refletirmos sobre o local onde vivemos, sua importância história e presente, e sobre os melhores caminhos para que siga se desenvolvendo no futuro. Mais do que apenas o aniversário de fundação da cidade (tornada duas pelo acordo que pôs fim aos horrores da guerra do Contestado), é uma data que evoca a evolução de uma trajetória rica em nomes e acontecimentos importantes, que por sua vez nos ajuda a compreender a caminhada de nosso país como um todo e, talvez tão importante quanto, nossa própria caminhada enquanto seres humanos únicos, com nossa própria história de vida, com nossos sonhos, frustrações e sucessos.
Surgida em um ponto central do antigo caminho de tropeiros que ligava os campos gaúchos à capital da então colônia portuguesa, tornada Império do Brasil em 1822, Porto União da Vitória em pouco tempo se tornou uma povoação florescente graças, principalmente, ao intenso movimento de pessoas e mercadorias que demandavam as águas do rio Iguaçu em direção fosse aos campos de Palmas, fosse ao litoral paranaense. Como ponto central do sistema de transportes nacional, a região rapidamente atraiu pessoas de posse, interessadas em lucrar ainda mais com uma atividade que se mostrava promissora e que, em breve, criaria novos grupos políticos e econômicos com atuação decisiva em várias esferas decisórias do recém emancipado país. Rafael Tobias de Aguiar, importante nome da política paulista de meados do século XIX, por exemplo, tornou-se rico e politicamente importante graças a suas atividades junto às tropas que passavam quase diariamente pelo vau que serviu de ponto de fundação da então povoação.
Nossa cidade, assim, desenvolveu-se sob a égide do comércio. Do transporte de larga escala. Em uma época em que o lombo das mulas faziam as vezes de motor de escoamento da produção sulina em direção às demais regiões do país e ao exterior, cresceu na exata proporção da demanda pelos caminhos já bem conhecidos e trilhados há décadas, da quantidade de alimentos e demais bens de consumo a serem vendidos nas feiras de Sorocaba e, posteriormente, nos mercados da corte carioca e das populosas vilas e cidades mineiras. Fase que, certamente não sabiam os habitantes de Porto União da Vitória de então, teria de terminar com a invenção de meios de locomoção mais rápidos, cômodos e baratos, que permitissem o transporte da mesma quantidade de mercadorias com o dispêndio de um mínimo de recursos. A locomotiva a vapor, inventada na Europa ainda nas primeiras décadas do Oitocentos, seria responsável pela rápida obsolescência das tropas (que, não obstante, continuariam a atravessas as águas do rio Iguaçu na região do vau mesmo já iniciado o século XX). Um risco iminente ao crescimento do progressista centro urbano, não fosse a chegada dos trilhos em seu território, nos idos de 1905.
Iniciou-se, assim, uma nova fase de Porto União da Vitória, ainda mais florescente que a anterior. Também baseada na passagem de passageiros e mercadorias, foi marcada pelo desenvolvimento do atual centro histórico de nossas cidades, o qual se tornou marcante tanto pelas dimensões e riqueza dos edifícios então construídos, quanto pela ousadia arquitetônica de suas fachadas (um tema sobre o qual já falamos rapidamente nestas páginas). Por essa época pessoas importantes por aqui passaram, deixando suas contribuições para a economia local. Destas, os presidentes Afonso Pena e Getúlio Vargas (o primeiro tendo vindo em razão da inauguração da estação ferroviária que leva seu nome, o segundo a caminho da posse como presidente revolucionário da República, em 1930), são apenas dois nomes dentre vários outros que poderiam ser citados (entre os quais o do presidente estadunidense Theodore Roosevelt, em demanda às instalações da Lumber, aqui localizadas). A cidade cresceu, se desenvolveu, e então se viu frente a frente com a catástrofe.
Políticas mal conduzidas com relação à desapropriação de terras para a construção da mesma ferrovia que trazia riqueza e desenvolvimento à cidade (um tema que será tratado aqui em oportunidades futuras) levaram ao confronto armado conhecido como Guerra do Contestado. Destruição, mortes, e a divisão de Porto União da Vitória em duas. Caso singular na história do país, definidor das décadas seguintes de sua trajetória histórica, juntamente com outro salto tecnológico de grande importância no sistema de transportes do país. A partir do governo de Juscelino Kubitschek, o processo de substituição dos transportes ferroviários pelos rodoviários tornou-se uma política de Estado aprofundada durante os anos de vigência do regime civil-militar, tornando obsoletas desta vez as locomotivas que se tornaram cada vez mais escassas e mal conservadas.
Ao abandono gradual dos trilhos não se seguiu a construção de rodovias boas o suficiente para garantir a sobrevivência da vocação de nossas cidades como importante ponto de entroncamento dos transportes do sul do país. Ao mesmo tempo, ao projeto mal fadado de desenvolvimento baseado na construção de trilhos e estações ferroviárias não se seguiu uma proposta duradoura de desenvolvimento econômico que garantisse a continuidade do crescimento até então verificado. A madeira foi acabando, e com ela a esperança de que seu beneficiamento pudesse devolver à região o vigor econômico verificado em outros tempos. Outras cidades ultrapassaram-nos no cenário paranaense, impondo desafios de grande monta a todos aqueles interessados no desenvolvimento da região.
E assim chegamos aos dias atuais, comemorando com justiça nossa riqueza histórica e natural, mas portadores de uma responsabilidade proporcional à nossa grandeza passada. O que fazer para que nossos filhos queiram continuar vivendo aqui, e que o local que tanto amamos possa contar com sua força criativa no futuro próximo? Que políticas adotar para resolver nossos problemas mais urgentes, tornando este um lugar ainda mais acolhedor para os que, como eu, chegam de longe em busca de uma qualidade de vida cada vez mais rara nos grandes centros do país? Questões sobre as quais devemos pensar enquanto festejamos este importante marco histórico. Porque a cada celebração do passado, deve seguir-se o planejamento de um futuro melhor. Parabéns União da Vitória! E que venham os próximos 126 anos!
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