Deslocamento
Um deslocamento sempre convém ao desejo, assim como ao discurso. É por isso que tentamos surpreender esse sujeito do inconsciente deixando-o falar livremente.
Aqui se refere em especial a uma indefinição dum suposto conteúdo.
Da ordem dos conceitos mais apreensíveis, pois pode ser reconstituída sua origem, verificada sua substituição, interpretado seu sentido, restabelecida suas associações, conhecido seu mecanismo.
Isoladamente é palavra absoluta, o uso conforme ao contexto é mais que aconselhável (vários professores).
Não significa que conviria como lucro, antes como economia, e entrementes como negação.
A que desejo? Ao desejo de quem? Há várias maneiras de se concebê-lo. Se o deslocamento lhe convém é porque o faz metonímico, assim como aos erros em geral, há por este artifício lingüístico um gozo. O desejo daí suposto é da ordem de um não sabido, um não querido saber, “enforque o ferreiro mesmo, só temos um alfaiate”.
A ambiguidade do sentido é igualmente um modo peculiar de deslocamento. Na ausência de uma mais inapreensível elaboração os jogos de sentido fornecem a própria estrutura do jogo metafórico, ressaltando que aquilo que se deseja saber seja por eles ocultado, disfarçado, meio dito.
Aquilo que cria laço.
Verbo.
A expressão “por isso” quando não indica “pôr isso” pronunciada “porisso” prepara uma justificação interligando uma proposição anterior à conseqüente. Por isso um elo associativo entre dois eventos (fatos, ditos) unidos racionalmente ou logicamente. Indica obviamente causa. Isso é também a tradução do latim id.
Não tentamos. Não é conveniente tentar.
Por isso não tentamos. Tudo trabalha a favor, na técnica, para que o sujeito seja surpreendido, ademais seu sintoma já é condição suficiente a tal surpresa. No entanto este ultrapassamento se revela antecipação no tempo, não no espaço. As técnicas que visam forçar tal surgimento recaem invariavelmente na resistência.
O pronome demonstrativo indica certa indeterminação quanto a sua identidade. De fato, é preciso supor um sujeito do inconsciente. Termo que justifica o ato de fala na qual o fator surpresa (mas não exclusivamente, é claro) se revela inarticulado (à consciência), nonsense, absurdo, fora de contexto, transposto o sentido a outro lugar. É em relação a esse dito capenga que se vincula quem falou, não sendo permissível desdizê-lo mais.
Genitivo.
Não se leve em conta oposição à consciência. Inconsciente aqui é “estruturado como uma linguagem” passível de interpretação, produtor de texto, pensamento, insabido, causa. Do ponto de vista simbólico amarrado à rede imaginária das identificações, às relações objetais, à dinâmica da transferência, daí o deslocamento. A articulação incide sobre substitutos, é por eles dotada de existência. Leve-se em conta, inobstante, inapreensibilidade do objeto.
O deixando-o apresenta inclusive uma propriedade visual do deslocamento. Esse logo à frente implica a variabilidade do objeto, por exemplo. O que equivale a perder o antigo. Eleger substitutos aleatoriamente não equivale a encontrar um que sirva ao fim transferencial, é por estancar na fantasia que esse deslocamento tem fim.
Diferentemente da lingüística que considera a língua, em oposição à fala, estruturada, homogênea e portanto sistemática, temos razões para termos conferido um percurso da pulsão através do ato de fala. Ela necessariamente vai da demanda ao significante da falta no Outro. Concordam, entretanto, lingüística e psicanálise com a subjetividade do falante, embora vejamos com maior interesse a não sistematização geral. Não é de tanto interesse a arbitrariedade do signo quanto seu uso.
“Faço-o falar” dizia Freud. Confiava a técnica a essa regra fundamental. Não anotava, não dava atenção especial a um ou outro aspecto. Essa segurança só pode atestar que embora haja a todo passo um deslocamento em proveito do traço unário, o importante não está exatamente naquilo que é dito e, que o sentido disso se encontra alhures. Com efeito, a associação não o é livre.
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