Em tempos de Coronavírus 4
Lendo um artigo na Folha de São Paulo há alguns dias, lembrei-me de um de meus filmes favoritos, Farenheit 451, (1966), de Fraçois Truffaut e que é baseado em livro homônimo de Ray Bradbury, de 1953. Trata-se de um olhar distópico sobre uma sociedade totalitária na qual não é mais permitido ler e para tanto, os livros são queimados por bombeiros e aqueles que insistem em preservar-los são presos e assassinados. Em certo momento do filme e claro que também do livro, um dos personagens centrais Guy Montagne, questiona seu comandante, um capitão, do porque de tudo aquilo e porque são os militares a executar a inglória façanha. O capitão, calmamente, reponde: não fomos nós que começamos isto. Os conservadores da sociedade civil começaram arrancando páginas dos livros por eles considerados atentatórios ao moral e aos bons costumes, o que culminou na intervenção militar, para extirpar de vez esses males que assediavam nossa sociedade.
Domingo assistindo um debate na Globo News, do qual participavam Guilherme Boulos, do PSOL, Cristóvão Buarque, do PDT e Bibo Nunes, deputado pelo PSL do Rio Grande do Sul, ouvi esse deputado insignificante, iletrado e despreparado, pois não respondia aos questionamentos, criticar Chico Buarque e Caetano Veloso, na tentativa vã de justificar o patrulhamento ideológico que Bolsonaro tenta, a todo custo, implantar na cultura. Bibo Nunes nem sequer existe se comparado a Chico e Caetano, entretanto, já tive o desprazer de ver pessoas criticando esse dois monumentos de nossa arte, tentando defender a inexistente política cultural do atual governo.
De novo lembrei-me de Farenheit 451, e, de imediato fui a meados de 1964, na tal marcha da família com Deus pela liberdade, quando os conservadores da sociedade civil pediam intervenção militar contra o que eles supunham ser a ameaça comunista. Muitos dos que foram nessa fatídica marcha que deu o combustível necessário para a implantação da ditadura, dela se arrependeram. A ditadura duraria 21 anos, mataria pelo menos 434 pessoas, isso sem contar os assassinados na guerrilha do Araguaia, cujos corpos jamais foram encontrados. Esses fatos me trouxeram outra lembrança, desta vez a recente greve dos caminhoneiros em 2018, e, que culminou com manifestações que passaram do simples apoio com ao obtuso chamamento de uma intervenção militar. Aqui em União da Vitória alguns manifestantes se prestaram ao ridículo de ir até à frente do 5º BEC e, de joelhos, pedir intervenção militar. Mais patético impossível, mas, no entanto isso tudo acabou culminando com a eleição de Bolsonaro e desnudando conservadores obscurantistas que sempre estiveram perto de nós, alguns muito perto, e não eram percebidos. Talvez porque não demonstrassem, explicitamente, sua homofobia, apenas condenavam a aparição de membros da comunidade LGBT em novelas e em nome de uma pseudo meritocracia eram contra as cotas raciais. Em nome da vida e de um fundamentalismo religioso contrariavam as liberdades individuais e se diziam, radicalmente, contrários ao aborto. Com a eleição de Bolsonaro essas pessoas se sentiram, efetivamente, representadas e saíram do mofo de seus armários munidos com bandeiras retrógradas e hoje ao lado de personagens nefastos, como Damares Alves, Ernesto Araújo, Abraham Weintraub, se constituem nos arautos do atraso. A sociedade está fraturada e nunca mais será a mesma, a não ser que os representantes da Idade das Trevas cedam, porque nós continuaremos entrincheirados resistindo.
Dedico esta crônica a Lina Sander Lazzarotti, Malu Longhi e Alciomara Buch.
Filmes para levar para uma ilha deserta
Leitor contumaz que sou da Folha de São Paulo, em especial de alguns colunistas como Contardo Caligaris, Elio Gaspari, Jânio de Freitas, Fernanda Torres e Ruy Castro entre outros, tenho acompanhado Ruy Castro enumerar os livros, discos e filmes que ele levaria para uma ilha deserta. Isso me instigou a também fazer minhas listas e convidar amigos para também fazê-lo. Aqui vão meus filmes escolhidos: 1 – Morte em Veneza (1971), de Luchino Visconti; 2 – Acossado (1960), de Jean Luc Godard; 3 – Os incompreendidos (1959), de François Truffaut; 4- Esposamante (1977), de Marco Vicário; 5 – Blow Up (1966), de Michelangelo Antonioni; 6 – O desespero de Veronika Voss, 1982, de Rainer Werner Fassbinder; 7- E la nave va (1983), de Federco Felini; 8 – Onde começa o inferno – Rio Bravo (1959), de Howard Hawks; 9- Casablanca (1952), de Michael Curtis; 10 – Noivo neurótico, noiva nervosa (1976), de Woody Allen.
Listei apenas um filme por diretor e também me ative até a década de 80. Numa próxima listo os posteriores aos anos 80.
É isso.
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