Então agora eu tenho inconsciente?
A Superinteressante publicou algo sobre o inconsciente, eu me dei ao trabalho (e comprei – R$ 13,50) de ler. O título diz: “o mundo secreto do inconsciente. Sim, ele realmente existe… a ciência confirma a principal teoria de Freud.” Tenho em casa mais duas delas, uma de 2002 cuja capa diz: “O fim da psicanálise? Será que alguém (incluindo você) ainda precisa de Freud?” E no índice um complemento ao leitor: “Neurologistas e estudiosos da mente dizem que a psicanálise está mais próxima da ficção que da ciência.” A outra data de 2008: “Terapia funciona?” blá blá blá “talvez isso nada tenha a ver com Freud.” É preciso admitir que não foram escritas pelos mesmos jornalistas, no entanto.
Acredito que essas reportagens devem vender bem. Afinal é um dos temas preferidos quando “não” se tem algo mais importante pra dizer, você me entende. Enfim, a reportagem mais recente assevera que apenas cinco por cento, segundo estimativas de experts da neurociência, da mente é consciente, restando 95% inconsciente. Os cientistas nos asseguram que todos os nossos comportamentos cotidianos, os automáticos, e vejam só incluíram a fala dessa vez, são governados pelo inconsciente. Eles ainda nos ensinam como domesticá-lo, ainda que parcialmente, por meio do exercício contínuo. Chamam a isso o novo inconsciente. Juro que não ri dessa vez. Já tentaram subconsciente, o termo pegou e eu particularmente acho mais charmoso. Mas talvez seja uma influência neo pós-moderna. O problema continua sendo simples: não se trata da mesma coisa. O que eles chamam novo inconsciente não é nada mais que uma função da memória, que como se sabe se estende por todo o córtex. Eles gostam do termo não-declarativa. De outro lado função do cerebelo, automatismo da tarefa motora. Mas há algo interessante (não digo super) nisso. É que reconhecem uma fonte interna ligada à angústia. Amígdala é sinônimo de angústia e de tudo que puder ser relacionado ao medo em neurociência. Reconheceram inclusive um princípio de transferência: o queridinho do professor se torna o melhor aluno. Descobriram também que há aprendizado inconsciente. Eu juro que vi um dia desses médicos afirmando que a ciência descobriu isso aqui: rir faz bem. Já vi pesquisas correlacionais (aquelas que não podem apontar causa e efeito) concluindo que, com base em seu levantamento, análise de dados, revisão teórica, tabelas, gráficos e interpretação, a violência cometida contra um sujeito aumenta a probabilidade dele próprio se tornar violento. Talvez eles cheguem a concluir que no que tange à aprendizagem só se pode aprender aquilo que já sabemos. E estão no caminho, a exemplo da língua materna. Mas uma coisa me chamou a atenção: eles quase admitiram que o inconsciente tem uma lógica. Infelizmente essa parte ficou um pouco ambígua. Um trecho diz que ele é essencialmente emocional enquanto a consciência é racional, mas em outra, que é ele que escolhe as palavras por nós quando vamos dizer algo. Fiquei confuso, será que ele pensa? Será que é lícito então supor um sujeito do inconsciente? Que me perdoem os leitores (os meus).
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