Ex-cre-ver
Se prossegue a palavra ser a morte da coisa ela não deixa de criá-la para a partir do nome ser vista. Materializar algo que já não é por acreditar fazê-lo. Equivalente à fórmula freudiana acerca do propósito psicanalítico: tornar consciente o que era inconsciente. Mas acordante também ao desejo, des-recalcar, desesquecer, decantar. Se crê, no entanto, haver um sujeito do discurso, sujeito que fala de um lugar, que é balizado pelo significante, é ouvido por um outro e se vê ser visto. Certamente se retiradas estas duas referências, simbólica e imaginária, ele não existiria, a não ser para os outros. Teríamos no exato lugar da materialização do suposto uma alucinação. A escrita só não o é por ser parcialmente compartilhada, mais ou menos inteligível, mas, menos que mais, naturalmente. E obviamente, porém, não há nada de natural aqui. Seria preciso desmontar toda a estrutura lingüística, des-ser, e descer à ex-sistência. Mas, se hesita, disse Joyce: hesitando em sua hesitência.
Como suporte, portanto, da crença no sujeito há sua imagem especular, de onde provém a investidura narcísica (a propósito da qual me ligaram para verificar se eu não havia enlouquecido, por conta de meu texto da semana retrasada) cuja identificação trabalha em conjunto com o simbólico, e fixa desse modo a um contexto o sujeito. Então ele passa para um campo na realidade, ainda que reste dele tudo aquilo que se convencionou chamar mundo interno, e por isso mesmo, a pertencer a uma rede, pra dizer o mínimo. Só que nesta rede ele foi inserido, e aqui, pra ser jogador tem que jogar como se joga. E como o que está em questão no jogo é o que está fora do jogo, o sujeito não entra em questão.
Resta assim do ver toda negatividade (não negação nem negativismo) que parece alimentar a produção. Do tempo – em um instante – da passagem daquilo que poderia ser e que de fato é quando dito (ou escrito) ao reconhecimento do que já não é e por isso o mais íntimo, se repete o mecanismo da própria formação do sujeito, desde o mistério do antes da linguagem, passando pela captura imaginária dependurada na palavra que cria o que esconde. Então quanto mais se crê mais se vê outro, pelo menos do Outro, na própria produção na objetividade da falta, em que crê, todavia existir.
Assim o movimento em sentido contrário conduz necessariamente a Outro, porque muito embora não seja explícito o endereçamento supõe-se ser interpretável, afirmando que ali falou. Mas falhou no exato momento em que foi mais exato, na proporção em que designou mais precisamente a imagem gráfica daquilo que tentara apreender, deslocou mais a frente seu objeto, pra nosso prazer (leitor) ele não para assim de se escrever. E desde o Outro pensamos compreendê-lo por termos nós feito da letra matéria de si mesmo.
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