Mulheres inalcançáveis
Em nossa infância, mais especificamente, no final dela, quando surgem as primeiras paixões, duas coisas parece acontecer, a primeira delas é o fato de escondermos essas paixões, provavelmente, por medo delas não serem correspondidas e também por timidez. A segunda é a sensação de que nunca alcançaremos o objeto de nossa paixão.
Na pré adolescência e já na adolescência, as coisas mudam e sentimos uma compulsiva necessidade de contarmos para os amigos mais próximos quem é objeto de nosso desejo, embora nem sempre dele nos aproximemos, ainda pelo temor da rejeição e ainda pela timidez que insiste em não nos abandonar. Daí o título dessa crônica, pois a maioria das mulheres, meninas ainda, parece inalcançável, inatingível. Creio que no imaginário feminino também deva haver os homens, supostamente, inalcançáveis, mas isso só as mulheres podem dizer e se alguma quiser se habilitar, essa coluna está aberta para publicar tal reflexão.
Quando eu cursava as últimas séries do antigo primário no Externato Santa Terezinha, havia uma garotinha que eu achava linda e que estudava na mesma série que eu. Nunca nos falávamos, até que um dia fui colocar minha mala em um banco e esta caiu e a linda menina a ajuntou e a colocou de volta no banco. Agradeci, trocamos sorrisos e continuamos a não nos falar. Eu apenas a olhava e às vezes tinha a impressão de que ela também me olhava. Terminei o primário e fui estudar no Colégio Estadual Túlio de França e fiquei muito tempo sem vê-la. A avistei anos depois já vestida com o uniforme do Colégio São José. Nunca nos falamos pessoalmente, além daquele episódio de minha mala escolar.
Reencontramos-nos ano passado em uma das redes sociais da Internet. Tornamos-nos bons amigos e ela inclusive agora também é colunista de Caiçara. Rosemarie Deimling, hoje de Carli é psicóloga. Trabalha e reside em Coronel Vivida, e é professora universitária em Pato Branco onde atende também como psicóloga. Neninha, como era e ainda chamada pelos amigos, foi a primeira a povoar meu imaginário como mulher inalcançável.
Alguns anos depois, nos postávamos, eu e mais alguns amigos, na esquina das ruas Barão do Cerro Azul e Coronel João Gualberto, para ver todo final de tarde uma garotinha passar em uma bicicleta Monareta verde. Ela dava a volta no quarteirão, sempre em cima da calçada, passava por nós, que a aguardávamos do outro lado da rua, parecendo não nos ver. Nós a admirávamos sem dizer nada, sua passagem era quase etérea, diáfana, como a música do Cocteau Twins, antes mesmo deles existirem. Rossandra Monteiro da Cunha, hoje Codagnone, foi mais uma das mulheres inalcançáveis, pelo menos em nosso imaginário que assistia perplexo sua passagem.
No ano seguinte, ou dois anos depois, conhecemos outra menina que morava onde hoje é a CDI, na esquina da Rua Barão do Cerro Azul com a Teixeira Soares. Conhecemos é modo de dizer, a víamos passar, eu Nivaldo Camargo e Paulo Murara. Como ficávamos ali olhando Rossandra passar em sua bicicleta, ficávamos na mesma esquina antes mencionada, onde morava Paulo, esperando Rosa passar. Rosa era seu nome. Seu sobrenome nunca soube e até hoje não sei. Sei apenas que a achávamos linda e ambos dizíamos que ela olhava para um de nós. É claro que eu dizia que era para mim, Nivaldo dizia que era para ele e Paulo dizia que era para ele. Nunca descobrimos, nunca perguntamos, nunca falamos com ela.
Certo dia ela foi embora e a dúvida e sua consequente inacessibilidade ficou pairando no ar por várias semanas, até se desfazer na fina poeira do ar, até que outra mulher inalcançável aparecesse para perturbar a calma de nosso sono.
Leave a comment