Para onde vai a educação brasileira?
Em tempos de Exame Nacional do Ensino Médio – Enem, creio que vale a pena refletir ainda mais uma vez nos caminhos tomados pela educação do país. O leitor irá perdoar que eu volte, após duas semanas de sentida (porém inevitável) ausência a tocar neste assunto que tem tomado cada vez mais linhas desta coluna, mas como historiador por formação e professor por vocação creio que a referência ao assunto é necessária, inevitável e salutar. Necessária porque a educação pública vive um momento absolutamente definidor. Não pode ser outra a definição de um contexto no qual este setor essencial para o futuro do país se encontra na iminência de sofrer um radical corte de investimentos que, programa-se, deverá durar vinte anos, engessando durante todo esse tempo qualquer possibilidade de melhorias. Há, sim, outros modos muito melhores e eficientes para equilibrar as contas nacionais (tributação de grandes fortunas, retirada de subsídios, controle mais estrito da evasão). O que leva a questionar porque a educação e a saúde são exatamente os primeiros setores a sofrerem intervenção do novo ministério da Fazenda, quando há, ainda, tanto a ser cortado e controlado em tantos setores do poder público.
Inevitável porque temos escolas e instituições de ensino ocupadas por estudantes em todo o país, com maior ênfase no estado do Paraná. Vincular tais movimentos estudantis com pretensas manobras partidárias espúrias é tão míope quanto demonstra a completa ignorância do que se passa no setor. Imaginar que se trata de um movimento de minoria conta apenas parte da verdade, de novo demonstrando total ignorância do que se passa na mente destes que representam o futuro do país. São minoria sim, como minoritários sempre foram e sempre serão todos os movimentos relacionados aos regimes democráticos concebidos e aplicados nos países ocidentais. Ou alguém imagina que foram para as ruas exigir a saída da presidente cem milhões de brasileiros mais um, o que representaria, em teoria, a maioria da população? Certamente que não. Aliás, ainda não estou convencido que a maioria da população queria a saída, menos de um ano após eleger aquela que neste momento, devido a movimentos políticos no mínimo curiosos, não mais governa a nação. Este é outro assunto, contudo…
E, finalmente, discutir a educação brasileira é salutar pois nos oferece a possibilidade de refletir, mais uma vez, sobre qual país queremos para nossos filhos e netos. Sobre como e quanto queremos receber de pensão quando nos aposentarmos. Sobre quem queremos que seja beneficiado pela organização estatal que permitimos que exista com o pagamento de nossos impostos caros, injustos, mal aproveitados e que estão na iminência de ser aumentados. Uma reflexão que deve se furtar a assumir qualquer pressuposto de cunho partidário. Pensar sobre o futuro da nação não é, me desculpem quem discordar, função de políticos e de partidos, principalmente dos políticos e partidos tais como são concebidos em nosso país, tal como ficou claro nos últimos meses nos quais as entranhas do poder, pela primeira vez em décadas, ficaram completamente expostas para quem quisesse ver. Programar o futuro da nação é tarefa desta própria nação, em seus múltiplos setores e com suas múltiplas representações, representações estas que não chegam a Brasília por falta de dinheiro para fazer uma boa campanha (ainda me assusto quando lembro do processo eleitoral recentemente terminado e me ponho a refletir sobre as origens do dinheiro utilizado para fazer tão suntuosas campanhas levadas a efeito nas principais cidades do país…) ou por puro e completo descrédito com relação às instituições políticas as quais, cada vez mais, parecem ter sido criadas para tudo, menos para permitir a boa gestão da res pública.
O Enem é o momento no qual este futuro fica, anualmente, presente na mente de todos os novos jovens. Futuro pessoal, bem entendido, uma vez que estamos falando de um exame que lhes permitirá ingressar nos cursos de graduação de sua preferência. Mas um futuro que, pessoal para cada um, se torna coletivo quando visto com maior distanciamento. Para exemplificar, basta referir que eu fui um dos estudantes que prestou o primeiro Enem, lá nos idos de 1999, e quando o fiz ele representava apenas um auxílio para entrar em algumas poucas universidades, públicas ou privadas. Hoje ele praticamente substituiu o vestibular, tornando o acesso ao ensino superior uma realidade mais palpável para grande parte da população. Seu futuro, assim como de toda a educação brasileira, é incerto, como fica demonstrado pela fala de certo deputado federal, representante de meu estado natal (São Paulo) quando afirmou com todas as palavras que “quem não tem dinheiro ou faz USP ou não faz faculdade”. Será que deve ser assim? É esse o futuro que queremos para nosso país? É essa a noção de “ordem e progresso” que deve presidir o governo da nação? Questões oportunas que devem ser refletidas e debatidas por toda a sociedade, hoje e sempre. Até a próxima!
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