Poema em chamas para o Museu Nacional
Uma reforma no Museu não recuperará
o afresco de Pompéia,
o trono de Adandozan, rei do Daomé,
ou seu par de sandálias talhado em madeira.
Nunca mais os cachimbos, conchas, corais,
besouros, borboletas, bengalas, múmias ancestrais,
artefatos etruscos, objetos em desuso que nem sonhava Cabral.
Todos os cacos de um mundo que ainda
existia e que agora,
contudo, são memórias de um Brasil do
futuro
que vai ficando cada vez mais para trás.
A cabeça de Luzia, outra vez extinta (agora e para sempre),
o megatério ou preguiça,
gigante a encantar as crianças nessa casa imperial,
o esquife de Sha-amun-en-su e outros
sarcófagos
há milhares luzindo ouro e seus egitos
faraônicos,
todos os tipos de esqueletos, libélulas
fossilizadas,
cujo voo se misturou às labaredas da Quinta da Boa Vista,
variados fragmentos de um mundo de
outrora,
coisas de dona Teresa Cristina ou de dona
Leopoldina,
plumária dos povos indígenas, pedaços de outros impérios,
ecos incas ou tikunas, seus milagres de
pervivência,
sua teimosia em restar.
São milênios misturados em cinzas,
sábio signo agora incinerado
e destinado tragicamente a se apagar.
Por quanto tempo a natureza guardou o
Maxakalisaurus topai?
O presidente dinossáurico em nota declarou:
“Foram perdidos duzentos anos de trabalho, pesquisa e conhecimento”.
Digo: perdidos foram milênios. Eras foram queimadas.
Uma reforma no Museu nada disso salvará.
Uma reforma no país o Brasil salvará?
Onde a verba para pesquisa?
Onde o pataco do patrimônio?
Onde a cota da CAPES?
Onde a água pra tanto fogo apagar?
Trágico esse sinistro final!
quantos milênios serão necessários
para reconstruir o Museu Nacional?
C. Moreira
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