Toma a palavra o entortável
(Arrotando) Aqui digo que nas antiga, poupando o plural, dizíamos assim pra falar assado, era-nos uma questão de estilo, posto que o estilo é a quem nos dirigimos. Fomos acusados pelo Advogado Trustme o Fonador justamente de praticarmos crimes de metáfora, nós trocávamos as coisas de lugar, e frente a um desejo crescente inflado e já violento era uma demonstração de sacrilégio ousar forçar a palavra dizer qualquer outra coisa senão aquilo que a reduzisse ao mínimo possível. Notamos que ainda assim fomos poupados porque embora começássemos a desentortar e a sermos o tanto mais cristalinos mais recaíamos na esteira linear do chão batido. Constatamos a existência de seres binários (sim ou não) que inventaram um sim-mas, não-mas, pra evitarem desaparecer com sua incoerência, mas sempre pendendo só pra lá, e sopraram, foram. Dissemos benditos usos imaginários do símbolo tão porque somente dele nos servimos e nele nos saímos mais ou menos quando fazemos o senso escorregar pra lá e pra cá pra não dizer tudo de uma vez onde se quebra no ritmo eu termino. De ter mino ia com pare sendo acima abaixo do sentido. Quando mostramos a literalidade onde lemos, nos escrevossomos da superfície não era de índice que se tratava. Quando nos entortamos à vista móvel da linha não era metáfora. Nós amarram a língua em operações e elas nos amarram no literal de tal modo que ao envolver meu corpo eu o sinto na língua e a desenrolo e solto e pululo mas jamais me desfaço dela porque nela habito tanto que ela me revira o próprio nome. Eu não manipulo objetos marteláveis nem cabeças-duras, o que em mim chama entortável é na realidade da ciência apenas o imagicenário do et cetera (miopia arbitrária), discurso onde o descuidado masturbador da verdade narcísica manipula-se. O que entorto com meu nome e nele removo e devolvo e contorno e devoro não é a brincadeira do esconde-esconde psicológico, enquanto entortação da superfície indico justamente a barra que separa imaginário do simbólico, o tubo tórico cuja psicologia teme e evita e reza e constela e conserta e faz os diabos pra fazer alguma coisa logo com isso porque isso é isso que sempre volta e sempre volta outro-mesmo. E ali onde se metamorfoseia até ali o psicólogo vai, deixando a cordinha atrás, pra se puxar metaforizado, franzindo as sobrancelhas assim / \ mas ele não avança, ele teme ele intui ele treme mas ele não vai. Se me chamei entortável é porque sou antipsicólogo, já segureiasponta depois de tê-las soltado e derreti junto com o mundo e então segurei e amarrei a meu modo. O que há quando se solta? Diga-me, o que há quando se solta?
O pós guerra foi o ápice da
humanidade.
Que diabos é isso que sempre volta? Freud havia chamado pulsão de morte essa insistência, mas ele passou por uma primeira guerra e viveu toda a ascensão do nazismo. Depois dele nós chegamos talvez a mais fina elaboração da história do pensamento, particularmente na França com o paradigma da linguagem, do estruturalismo, e de tantos pensadores da cultura desde os mais diversos vieses, da influência da linguística de Saussure, a antropologia de Strauss, a filosofia de Sartre, Heidegger, Wittgenstein, às teorias do poder de Foucault, a psicanálise de Lacan, o surrealismo de Dali, enfim, Deleuze, Derrida e tantos outros. Nós nos perguntávamos porque há períodos na história que reúnem tantas cabeças brilhantes e supúnhamos que vários fatores possibilitam essa conjunção, seus antepassados, o discurso da ciência, o espírito do tempo, etc. Certamente nós apenas começamos a colher os frutos desse trabalho que ficará inscrito na história, talvez, como um período semelhante ao grego, cujos conhecimentos e cultura permanecem sob o olhar indagador do contemporâneo evoluído como uma idade de ouro. Jamais se compreendeu como a sabedoria grega chegou em seu ápice e que fatores levaram a isso. Nós, por outro lado, vivemos uma época intervalar, rápida, onde vimos a liberdade mostrar as perninhas para em seguida ser aprisionada mais uma vez. Aprendemos com essa época de ouro moderna que o discurso, a palavra, é o grau mais elevado de sofisticação. É da linguagem que se criam máquinas, é na linguagem que se operam trocas, e pela linguagem que se relacionam, e por linguagem que guerreiam. Nós chegamos ao cerne da estrutura de poder, da estrutura política, da estrutura familiar, da estrutura social, da estrutura do sexo, como constituídas por efeitos de discurso. Nós partilhamos dessa capacidade a quem fosse, exercemos nossa condição de sujeito ao falarmos, desejarmos, resistirmos, denunciamos os mecanismos ideológicos por trás dos discursos e dizeres. Isto ainda é pouco. Sim. O poder não é invisível. Tínhamos a faca e o queijo na mão. Primeiro perderemos o queijo, pois a faca terá serventia. Depois a faca, se não a recusarmos já.
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