Um conto ligeiro
Ele contava que internado daquele jeito não tinha muito o que fazer, aproveitar a situação, por exemplo, você podia chamar a enfermeira e fingir uma dor na virilha, muitas examinariam. Em dois dias tudo voltaria ao normal, um amigo contaria para os outros que sua mãe pediu para um enfermeiro te dar banho, mas não diria que você recusou. Naquele quarto passou tanta gente que ele até sentia-se bem. Uns tinham pena, olhe vamos sair, tem uma festa aqui pertinho, ok, boa festa, e iam fechando a porta devagar. Ficar quatro dias sem fumar era novidade, mas uma coisa é estar lá deitado trancado naquele fedor de hospital, outra é sair andando lá fora e respirar ar puro, a gente precisa logo de mais alguma coisa. Depois teria um show de uma banda, nem bebia naquela época. Então aparece alguém que estudava na faculdade de não sei o que e diz que Marx disse alguma coisa sobre algum assunto, e eu tinha perdido meu colar na saída porque não podia entrar com aquilo, pegaram da caixa o que mais gostaram, e eu não me lembro sinceramente se não levei também um embora por vingança. Na calçada vinha um cachorro segurando na boca sua coleira dizendo claramente pra todos que passavam por ele: vejam domestiquei essa pessoa, e a pessoa seguia fiel ao lado, sem avançar em ninguém, mas passávamos longe, pra não dar bandeira. Agora o que se conta disso é outra história, contam que em primeiro lugar o internamento existiu mas não a enfermeira, seria uma daquelas estórias que a pessoa conta como se fosse outra, e o banho? Bom, em quatro dias houve um só, talvez dois, sempre sozinho. A parte do cachorro é verdadeira no entanto, mas não aconteceu bem assim, porque todo mundo sabe, afinal, que uma pessoa bem adestrada é capaz de coisas incríveis, elas podem criar códigos, podem interpretar relativamente, muitas coisas mesmo, mas voltemos a ele, aos quinze anos de idade, doente, inexperiente, teria a audácia, porque imaginação certamente ele teria, teria a audácia de dizer: moça, fazendo uma cara de dor, você pode dar uma olhadinha aqui? E se dissesse teria dito antes ou depois do banho? Certamente depois já que se aquela porta se fechasse, e não estou dizendo que se fechou, mas se se fechasse seria de mau gosto estar sujo não é? Digamos que ela tenha então partido ao exame, é possível que ele relaxasse um pouco colocando as duas mãos atrás da cabeça, e ficasse espiando com os olhos semicerrados enquanto ouvia a voz dela perguntar, aqui? E apertar lentamente a mão na virilha enquanto respondia com voz trêmula, mais no meio, e a enfermeira apalpava e perguntava, mais? E ele dizia sim. É curioso que homens dessa idade sintam-se atraídos por mulheres ligeiramente mais velhas, porque eles sabem que elas sabem mais que eles, tudo é excitante pelo fato de ser novo, proibido, etc, mas lendo isso eu não conseguia deixar de pensar que tudo não passava de uma estória inventada, ou retirada de algum jornal e contada depois sem nenhum motivo.
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