Um dos mais ilustres intelectuais paranaenses
Inicio a crônica desta semana agradecendo ao dileto amigo Odilon Muncinelli, as belas palavras a mim dedicadas em sua sempre ótima coluna, Milho no Monjolo, no Jornal O Comércio.
Odilon além de um brilhante advogado está no panteão de ilustres intelectuais de União da Vitória e Porto União. Como Dídio Augusto, Alvir Riesemberg, Ciro Côrrea, Carlos Treuk, Valmir de França, Almir Rosa e Luiz Roberto Soares.
E por coincidência, na mesma coluna em que Odilon dedica a esse modesto cronista e gestor cultural, ele também fala de Luiz Roberto Soares, lembrando inclusive de sua magnífica atuação como Secretário de Cultura do Paraná.
Falo em coincidência porque, exatamente, naquela semana estava começando a escrever a crônicas sobre meus caros amigos, enfocando, justamente, Luiz Roberto Soares.
No final do ano passado, recebi a visita de meu caríssimo amigo Almir Rosa e dele recebi de presente o livro 1939 – Um episódio em Porto Alegre,uma coletânea de crônicas de Rubem Braga e no qual figura a crônica Chô Urubu, escrita em 9 de setembro de 1939, e, que fala de União da Vitória e Porto União, quando Braga por aqui passou.
Mas uso a menção de Odilon e a visita de Almir, personagem já enfocado em uma de minhas crônicas, para falar, como disse acima, do amigo comum, Luiz Roberto Soares, por nós sempre lembrado com saudade, cada vez que nos encontramos.
No início de 1980, fui convidado pelo então prefeito de União da Vitória, Gilberto Brittes, para ocupar o cargo de assessor de imprensa da Prefeitura. Aceitei, conseguindo conciliar tal atividade com a de Diretor de Programação da Rádio União, na época dirigida pelo saudoso Lari Bogus.
Nesta época o diretor da FAFI era Almir, que já na época além de meu grande amigo, era ao lado de Valmir França mentor do Cine Clube Imagem, por mim fundado na época. Os filmes eram exibidos na FAFI, em um projetor da própria faculdade e outro do Colégio Túlio de França, conseguido por Valmir, que também era o nosso projecionista. O primeiro filme exibido pelo Cine Clube, foi O Céu pode esperar, remake do clássico dos anos 50, dirigido e protagonizado por Warren Beatty. Antes de exibirmos esse longa, apresentamos para um público que lotava o auditório da FAFI, uma filmagem em Super 8, feita por outro caríssimo amigo, Levi Pacheco, da sacada de sua casa, do incêndio que consumiu por completo e prédio de Antônio Swierk, na Rua 7 de Setembro, onde funcionava uma fábrica de móveis.
Mas relato aqui o início da trajetória do Cine Clube Imagem, para fazer um link, com um Curso de Cinema, que organizei, já como assessor de imprensa da Prefeitura e iniciando ali minha atividade de gestor cultural. Com o auxílio do prefeito Gilberto Brittes e do Secretário de Estado da Cultura, Luiz Roberto Soares, trouxe para ministrar o curso as cineastas Berenice Mendes e Maria de Lurdes Rufalco. Bere que, recentemente, dirigiu a TV Educativa de Curitiba e Lu ocupou uma diretoria no Teatro Guaíra.
Luiz Roberto como Secretário da Cultura incluiu União da Vitória nos principais roteiros culturais do estado e como a prefeitura não tinha sequer um departamento de cultura, Gilberto me chamou um dia em seu gabinete e na presença de Luiz Roberto e Almir, me incumbiu das questões culturais. Oportuno salientar que Almir, imediatamente, se prontificou para colaborar e assim o fez. Foi dessa forma que aqui estiveram Dóris Monteiro, Sérgio Ricardo, o dublê de cineasta e compositor e que ao ser vaiado em um dos memoráveis festivais da canção dos anos 60, quebrou o violão, atirou-o na plateia e saiu enfurecido. Também aqui estiveram o grupo vocálico Viva Voz, um dos mais festejados dos anos 80, o violinista Sebastião Tapajós e, posteriormente, o Festival Todos os Cantos, que percorreu nove cidades em etapas eliminatórias e que aqui trouxe o cantor e compositor Carlos Lyra, um dos fundadores da bossa nova, sua mulher, a bela americana, Kate Lyra, notabilizada na época por um quadro humorístico em que dizia: brasileiro bonzinho. Também fizeram parte do célebre corpo de jurados, Billy Blanco, outro dos fundadores da bossa nova, Reginaldo Bessa, que no Festival Abertura, da Rede Globo havia classificado a emblemática canção, O Tempo. Ainda compôs o júri o cantor e compositor César Costa Filho, parceiro de meu amigo, o curitibano Heitor Valente, que faleceu há alguns anos e, que, Luiz Roberto chamava, carinhosamente, de Heitorzinho. É da dupla a autoria da canção Assim simplesmente, com letra de Heitor e que considero, sem nenhum exagero, uma das mais belas letras da música popular brasileira.
Finalizando a composição do corpo de jurados estavam a cantora Dóris Monteiro, que aqui já havia se apresentado meses antes e o trombonista Raulzinho de Souza, um dos maiores do mundo e que logo após a final do festival realizado em Curitiba, em dezembro de 80, se mudaria para os Estados Unidos da América, e faria promissora carreira tocando entre os maiores músicos de jazz do mundo.
Depois do Festival, já em 1981, Luiz Roberto perguntaria para mim e para Almir, se gostaríamos de receber um show do cantor e compositor Luís Melodia. Aceitamos na hora, mas houve pouco tempo para divulgação, cerca de três dias, o que resultou num público muito pequeno.
O show aconteceu no Clube Apolo e como havia pouca gente, Melodia disse que não iria cantar e que considerava o pouco público uma manifestação racista de uma população de origem europeia. Eu e Almir explicamos a ele que não se tratava disso. Que havíamos recebido a confirmação muito em cima da hora e por isso a divulgação ficou aquém do desejado. Ele não arredou pé, dizendo que não iria cantar, quando Almir teve a luminosa ideia de mandar sua filha, Manoela, ainda muito garotinha, pedir para Melodia cantar. Acertou na veia, ele se comoveu e disse que iria cantar. Decidimos ali na hora, atrasar o show para às 22h30, e como era um domingo, fomos eu, Almir e mais uns amigos até a saída do público que estava no Cine Ópera, divulgar o show que era gratuito. Conseguimos um bom público, cerca de 200 pessoas, e, Melodia fez um show memorável lançando seu disco Mistério da Raça. Junto com Melodia estava o cantor e compositor paranaense, João Lopes, que abria os shows do carioca em sua turnê paranaense. Lopes é o autor de Bicho do Paraná, recém lançada e a exemplo de Melodia agradou o público.
O período em que Luiz Roberto foi Secretário de Cultura não foi profícuo só para União da Vitória, mas para todo o Paraná. Foi, justamente, em sua época que Curitiba, passou a ser chamada de o termômetro teatral nacional. Todas as principais peças teatrais do país estreavam em Curitiba, graças ao esforço de nosso nobre Cósqui. Se fossem bem em Curitiba, onde o público era e ainda é considerado frio, iria bem no resto do país.
Assim foi, por exemplo, com Rasga Coração, a mítica peça de Oduvaldo Viana Filho, o Vianinha, proibida pela ditadura militar e de enorme sucesso em todo país, iniciado em Curitiba.
Em 1988 ele veio a União da Vitória para dar um depoimento de apoio à campanha de Gilberto Brittes, que concorria à Prefeitura Municipal. Como era eu que coordenava a propaganda eleitoral da chapa encabeçada por Gilberto, fiquei incumbido de recepcionar Luiz Roberto e fazermos as gravações de apoio. Fomos almoçar no Restaurante San Rafael, e, logo após o almoço ele meu deu uma aspirina, dizendo que era bom para o coração e que os médicos que o haviam operado e lhe introduzido uma ponte safena, haviam indicado. Antes de irmos para a rádio fazer a gravação, subimos até seu quarto e ele me presenteou com um vidro da aspirina americana.
Trouxe Luiz Roberto, que já há algum tempo não vinha a União da Vitória, em 2004 para uma palestra sobre o Contestado. Alinhavamos uma próxima palestra, sobre a Inquisição e que acabou nunca acontecendo.
Após essa palestra, derrotamos um litro de Black & White e ficamos conversando até altas horas em frente ao Hotel Holz, onde ele estava hospedado.
No final de 2006, fui visitá-lo no Museu Paranaense e conhecer um pouco da monumental obra que ele estava escrevendo sobre o Paraná, coadjuvado por Almir Rosa.
Em 2007, fui encontrá-lo na editora Travessa do Editor, de propriedade do jornalista Fábio Campana. Conversamos boa parte da tarde, e, saí de lá com uma sacola de livros que ambos me presentearam. Como em 2007, eu já não dirigia mais, ele me levou para o apartamento de minhas filhas. Foi a última vez que o vi.
Um pouco antes de seu falecimento, ele foi cotado para assumir uma secretaria de estado e confidenciou para o amigo Almir Rosa que se isso se confirmasse, era para Almir e eu arrumarmos as malas, que iríamos trabalhar com ele, o que mais uma vez não aconteceu, uma vez que no final de 1981 ele me convidou para assumir uma diretoria no Museu da Imagem e do Som, em Curitiba. Quando ele fez o convite, Almir estava comigo e sugeriu: ponha ele na presidência do MIS, senão não vale a pena, sob o aspecto financeiro. Cósqui respondeu que como 1982, seria um ano eleitoral e ele iria coordenar a campanha de Saul Raiz, em 1983, eu iria ou para a presidência do MIS ou para uma diretoria na Secretaria de Estado da Cultura. Perdemos a eleição e o resto nem precisa contar.
Com a morte de Luiz Roberto Nogueira Soares, União da Vitória, e, o Paraná, perderam um de seus mais ilustres intelectuais e, eu, e, Almir perdemos um caríssimo amigo.
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