Um professor brilhante, um intelectual como poucos
Conheci Almir Rosa no final dos anos 70, ocasião em que ele ocupava o cargo de diretor da FAFI. Em minha adolescência havia sido amigo de sua irmã, Neusa Rosa, a Neusinha, que estudara comigo no Colégio São José. Em 1980, Almir era diretor da FAFI, e, eu era assessor de imprensa do então prefeito Gilberto Brittes e respondia, informalmente, pelos assuntos culturais da Prefeitura de União da Vitória que na época era, seguidamente, contemplada e incluída em inúmeros projetos culturais da Secretaria de Estado da Cultura e do Esporte, cujo Secretário era Luiz Roberto Soares, natural de Porto União e que dessa forma fazia questão de incluir União da Vitória nos roteiros culturais de sua Secretaria. Fizemos inúmeras parcerias, Prefeitura e FAFI, sendo uma delas a criação do Cine Clube Imagem, que funcionava na FAFI, com um projetor da própria instituição e outro cedido pelo Colégio Túlio de França. Oportuno lembrar que o projecionista era também um de meus companheiros na diretoria do Cine Clube, o também professor Valmir de França, hoje com doutorado em Rennes, na França e residindo em Londrina. Valmir a exemplo de Almir também é um de meus caros amigos e será um dos próximos personagens desta coluna.
Seguimos trocando informações, dicas de leitura e juntos, eu na Prefeitura e ele na Faculdade, organizando os diversos projetos da Secretaria de Estado da Cultura, entre os quais um show com o cantor e compositor Luis Melodia, no Clube Apolo, e, que diante de um pequeno público, uma vez que sua apresentação havia sido marcada com pouco tempo para a efetiva divulgação, recusava-se a cantar suspeitando de uma manifestação de cunho racista, pois Melodia é negro. Insistíamos, eu e Almir, para ele fazer o show, explicando que não houve racismo e sim pouco tempo para a divulgação do show. Melodia permanecia irredutível, quando Almir teve a idéia de mandar sua filha Manoela, então com uns seis anos de idade, pedir a ele que cantasse. O pedido da pequena garotinha sensibilizou o cantor, que resolveu fazer o show.
Como era domingo, decidimos ali mesmo mudar o horário das 21 para as 22 horas, e esperar o término do filme apresentado no Cine Ópera.
Divulgamos o show na saída do cinema e conseguimos reunir um bom público. Melodia e banda fizeram um ótimo show, do qual fazia parte a bela, Mistério da Raça.
Em 1981, Luiz Roberto Soares me convidou para ser diretor do Museu da Imagem e do Som em Curitiba e Almir não só endossou o pedido, como sugeriu que ocupasse a presidência do MIS. O cargo já estava ocupado, declinei do convite para a diretoria, preferindo continuar na assessoria de imprensa e também respondendo pelos assuntos culturais da Prefeitura de União da Vitória.
Em 1982, apoiei a candidatura de Almir para prefeito e também fui candidato a vereador. Não nos elegemos. Enfrentamos além dos adversários, o voto vinculado. Naquele ano houve eleição de vereador a governador e o eleitor era obrigado a votar em candidatos do mesmo partido e se caso não o fizesse, o voto era anulado. Foi a hora da virada o PMDB ganhou tudo e nós, do então PDS perdemos tudo. Mas fui até o fim ao lado de Almir, culto, inteligente, teria sido um grande prefeito.
Em 1983, resolvi fazer o curso de História na FAFI e em 1984, ao ver o total atrelamento do diretório acadêmico com a direção da instituição, montamos uma chapa que era composta, basicamente, por alunos de uma mesma sala. Articulamos a chapa, eu Silvana Prado e o saudoso Mauricio Campos. Iríamos enfrentar a chapa de situação, apoiada pela direção e composta, em sua maioria, pelos acadêmicos de Matemática, que há muitos anos estavam no poder. Lançamos a chapa a apenas uma semana da eleição, tendo Almir como nosso presidente de honra. Chamamos a chapa de situação para um grande debate. Eles não aceitaram.
Usamos a exaustão a recusa em participar do debate e apresentamos um consistente programa de ações. A eleição teve cerca de 700 votantes, e, ganhamos por nove votos, com Almir a nosso lado.
Nos anos 90, Almir seria por mais duas vezes diretor daquela instituição.
Quando fiz 40 anos recebi dele e de Orli, sua mulher, um livro com a seguinte dedicatória: “Para quem não usa a cabeça apenas para usar chapéu”.
Almir e Valmir França foi quem ao lado de meus familiares, estimulou não somente meu gosto pela leitura, mas acima disso um senso crítico e um olhar mais reflexivo. Foi e é para mim, uma espécie de guru intelectual.
Agora mesmo acabo de ler o livro O Código da Vida, de Saulo Ramos e emprestado por Almir. Depois de degustar aquele fantástico relato de um dos maiores advogado de direito constitucional do Brasil, ex Procurador Geral da República e ex Ministro da Justiça, pedi permissão a Almir para emprestá-lo à minha filha Mayara, que é advogada.
Intelectual brilhante, dono de um senso de humor corrosivo, Almir inspirou uma imensa plêiade de alunos e seguidores, quer seja, como professor, diretor de instituição de ensino, assim como na política partidária. Nunca se rendeu à idiotia, tampouco à hipocrisia. Criticou ora de forma caustica, ora de forma sarcástica aqueles que insistiam em se agarrar ao poder, assim como criticou aqueles que inebriados pelo poder, esqueciam de sua transitoriedade.
Preferiu ir pra casa, abandonou a política partidária e se aposentou da carreira educacional. Vive em meio aos livros, isso quando não está em Curitiba, visitando os filhos Júnior e Ângela, que moram lá e, logicamente, as livrarias, principalmente, a FNAC, que fica próxima ao apartamento de um dos filhos e a Livraria do Chaim, nosso indefectível amigo comum.
Vida longa meu amigo, há muita gente que te admira e lamenta a tua precoce retirada da cena educacional e política. Eu também lamento, mas tenho a felicidade de privar de seu convívio e, conseqüentemente, de sua sabedoria.
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